
A hipocalemia é um distúrbio hidroeletrolítico que se caracteriza por uma redução dos níveis de potássio no sangue para valores abaixo de 3,5 mEq/L (referência 3,5 a 5,0 mEq/L). Este desequilíbrio pode afetar diversos sistemas do corpo, especialmente o cardiovascular, muscular e nervoso. A seguir, exploraremos a definição, os sintomas e sinais clínicos, o diagnóstico e as abordagens terapêuticas para essa condição .
1. DEFINIÇÃO DE HIPOCALEMIA
O potássio é o principal ânion intracelular e desempenha funções essenciais, como a regulação do potencial de membrana celular, a contração muscular, a transmissão nervosa e a manutenção da função cardíaca. Além disso, a concentração de potássio no organismo é controlada pela bomba Na+/K+-ATPase e pelo equilíbrio entre os compartimentos intra e extracelular.
A hipocalemia pode ser classificada em graus conforme a concentração plasmática:
- Leve: 3,0 a 3,5 mEq/L, geralmente assintomática.
- Moderada: 2,5 a 3,0 mEq/L, com sintomas discretos.
- Grave: Menor que 2,5 mEq/L, podendo causar manifestações graves, como arritmias e paralisia.
2. FISIOPATOLOGIA DA HIPOCALEMIA
O potássio é obtido por meio da dieta, com uma absorção gastrointestinal praticamente completa. Em virtude dessa característica, ocorre diariamente um excedente de aproximadamente 1 mEq/kg/dia (60 a 100 mEq). Desse excesso, cerca de 90% é eliminado pelos rins, enquanto os outros 10% são excretados pelo trato gastrointestinal.
A homeostase do potássio é mantida principalmente pela regulação da excreção renal, com participação significativa das glândulas suprarrenais e do pâncreas. O principal local de regulação é o ducto coletor renal, onde estão presentes os receptores de aldosterona. Por sua vez, o cólon é a região do intestino com maior importância na regulação do potássio perdido através das fezes.
Os mecanismos fisiopatológicos da hipocalemia podem ser classificados em três principais categorias: aumento da excreção de potássio pelos rins ou trato gastrointestinal, redução da ingestão alimentar de potássio ou deslocamento do potássio do espaço extracelular para o intracelular. Embora a má ingestão ou um deslocamento intracelular sejam causas incomuns isoladamente, várias causas geralmente estão presentes simultaneamente no paciente com hipocalemia.
2.1 AUMENTO DA EXCREÇÃO RENAL E/OU PERDAS PELO TGI
O aumento da excreção renal ou das perdas pelo trato gastrointestinal é o mecanismo mais frequentemente associado à hipocalemia. No caso dos rins, os principais fatores incluem o uso de diuréticos, que aumentam a oferta de sódio no ducto coletor, o hiperaldosteronismo primário e secundário, e a poliúria. Em relação ao trato gastrointestinal, vômitos e diarreia são as causas mais comuns de perda excessiva de potássio.
2.3 TRANSIÇÃO DO MEIO EXTRACELULAR PARA INTRACELULAR
O potássio é um cátion com alta capacidade de transitar entre o meio extracelular e o intracelular. Essa movimentação pode ser intensificada por substâncias endógenas e exógenas, contribuindo para o desenvolvimento da hipocalemia. Entre os principais fatores envolvidos nesse processo estão a insulina e os agonistas beta-adrenérgicos, que estimulam a entrada do potássio nas células, reduzindo sua concentração no plasma. Além disso, alcalose respiratória ou metabólica estimula a entrada de potássio nas células na medida que promove a saída dos íons hidrogênio.
2.4 INGESTÃO INADEQUADA DE POTÁSSIO
A ingestão inadequada de potássio pode ocorrer devido a diversas condições. Transtornos alimentares, como anorexia, bulimia, fome prolongada, pica e alcoolismo, são fatores comuns que levam a essa deficiência. Problemas dentários, que afetam a capacidade de mastigar ou engolir, também podem interferir na ingestão de alimentos ricos em potássio. Além disso, a pobreza pode resultar em uma dieta pobre em qualidade ou quantidade, como a alimentação limitada a chá e torradas, comum entre idosos. Durante a hospitalização, a nutrição parenteral (TPN) com baixo teor de potássio pode ser outro fator que contribui para a deficiência desse nutriente.
3. SINTOMAS E EXAME FÍSICO
3.1 HISTÓRIA CLÍNICA
Os sintomas da hipocalemia podem variar de acordo com o grau de severidade, normalmente envolvem o sistema cardiovascular e muscular . Alguns sinais comuns incluem:
- Fraqueza muscular: Inicia nos membros inferiores e pode progredir para paralisia em casos graves.
- Câimbras e dores musculares: Resultam da dificuldade na condução dos impulsos nervosos.
- Alterações cardiovasculares: Incluem palpitações, arritmias e, em casos graves, risco de parada cardíaca.
- Distúrbios gastrointestinais: Como constipação e ileo paralítico.
Os pacientes frequentemente são assintomáticos, especialmente nos casos de hipocalemia leve (> 3,0 mEq/l). Quando os sintomas estão presentes, muitas vezes estão relacionados à causa subjacente da hipocalemia, e não à hipocalemia em si.
3.2 EXAME FÍSICO
No exame físico, é possível identificar:
- Fraqueza muscular progressiva.
- Reflexos tendinosos profundos diminuídos ou ausentes.
- Pressão arterial normal ou levemente reduzida.
A erosão dentária pode ser observada em pacientes com bulimia, especialmente em aqueles com histórico de alto risco, como obsessão com imagem corporal ou participação em atividades como luta ou concursos. A erosão dentária pode ser observada em pacientes com bulimia, especialmente em aqueles com histórico de alto risco, como obsessão com imagem corporal ou participação em atividades como cheerleading, luta ou modelagem.
Diagnóstico
O diagnóstico da hipocalemia baseia-se na combinação de história clínica, exame físico e exames laboratoriais. Os principais passos incluem:
- Dosagem de potássio sérico: Confirma os níveis reduzidos de potássio.
- Eletrocardiograma (ECG): Identifica alterações cardíacas, como achatamento da onda T, presença de ondas U e prolongamento do intervalo QT.
- Investigacão das causas: Inclui avaliação de perdas gastrointestinais (vômitos, diarreias), uso de medicamentos (diuréticos, laxantes), alterações hormonais (hiperaldosteronismo) e redistribuição do potássio (alcalose metabólica).
Tratamento
O manejo da hipocalemia envolve a identificação e correção da causa subjacente, além da reposição de potássio. A abordagem terapêutica depende da gravidade do caso:
- Hipocalemia leve:
- Reposição oral de potássio (ex.: cloreto de potássio).
- Orientação sobre a dieta rica em potássio (ex.: bananas, laranjas, espinafre, batatas).
- Hipocalemia moderada a grave:
- Reposição intravenosa de potássio, com monitorização contínua.
- Ajuste cuidadoso para evitar hiperpotassemia.
- Correção de fatores associados:
- Tratamento de distúrbios ácido-básicos (ex.: alcalose).
- Suspensão ou ajuste de medicamentos que causam perda de potássio.